Créditos da imagem: arquibancadatricolor.com.br
Não é de hoje que se vê, notadamente no futebol, crimes praticados por grupos de pessoas que, devido a múltiplos fatores, transformam-se nos dias de jogos em delinquentes de grande potencial ofensivo.
A experiência ensina que nesses casos a ação criminosa, isto é, o tornar-se violento, cruel e insensível, está intimamente ligada ao ambiente em que está, mas isso está longe de ser a regra geral.
É interessante observar que muitos desses indivíduos que se digladiam em dias de jogos, quer nos estádios e seus entornos ou nas estações de metrô, praças etc., na vida cotidiana apresentam-se como pessoas equilibradas, sem desvio de comportamento, todavia, quando se juntam a outras atuam de forma agressiva, violenta, covarde, e produzem crimes torpes que chocam o país.
É o que ocorre, já há algum tempo, com as chamadas torcidas uniformizadas, resquício de selvageria e covardia que vem preocupando as autoridades brasileiras. O fenômeno é mundial, haja vista os holligans ingleses, alemães e os rebeldes “Barra Bravas” argentinos responsáveis por inúmeras e conhecidas tragédias em praças desportivas.
Um simples torcedor pode ser, de um momento para outro, um criminoso grupal, com um desejo irrefreável de causar mal ao seu semelhante. Recentemente, para citar apenas um dos milhares, um bando a caminho de um estádio de futebol executou a tiros dois rapazes que se negaram, num ponto de ônibus, a tirar a camisa do seu time preferido.
Não é um caso isolado. São frequentes os casos em que torcedores são atacados dentro e fora dos estádios.
O que impressiona é que as pessoas que se juntam nessas ocasiões possuem opiniões, crenças, costumes, formação cultural e hábitos completamente diferentes e acabam por massacrar um homem sem nenhum fundamento lógico e sem nenhuma piedade. Acreditamos que, se sozinhos estivessem, seriam os primeiros a socorrer aquele homem que ajudaram a matar.
O Estatuto do Torcedor – Lei nº. 10.671, de 15.5.2003 – responsabiliza de forma solidária as entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes e as entidades de prática desportiva detentoras do mando de jogo e seus dirigentes pelos prejuízos causados ao torcedor relacionados à falta de segurança, independentemente da existência de culpa.
A Polícia que apenas combate os efeitos dessa tempestade criminosa e é injustamente a mais criticada, tem feito a sua parte na prevenção e repressão desses delitos, filmando os exaltados nos estádios, evitando o confronto de torcedores e apurando as infrações penais cometidas.
Mas pode fazer mais. A criação de uma Delegacia de Polícia que reprima e investigue exclusivamente os crimes cometidos em razão do esporte, abrangendo aí, infelizmente, os próprios atletas que, muitas vezes, incentivam a violência, mandando torcedores se calarem, praticando violência desnecessária nos gramados, tenderá a diminuir o número de vítimas. De outra parte, não se vê a mesma preocupação nos dirigentes do futebol. Insistem em manter a rivalidade entre os grandes clubes brasileiros. Passam ao torcedor a imagem de duelo, de revanchismo e de ódio ao clube concorrente. A mediocridade ainda se faz presente num ambiente em que deveria prevalecer o profissionalismo.
São conhecidos os casos em que representantes de clubes se abraçam nas reuniões a portas fechadas e se ofendem diante dos microfones e câmeras de televisão. Alimentam a rivalidade quando deveriam exterminá-la.
Narradores e comentaristas esportivos têm também sua parcela de responsabilidade sobre a violência esportiva. Em vez de criticarem constantemente a Polícia e as torcidas uniformizadas, deveriam ajudar na identificação dos criminosos, conscientizar o fanfarrão, alertá-lo do risco que a violência representa, adverti-lo sobre a prisão em flagrante e que estão destruindo o esporte mais popular do Brasil.
Nossa imprensa tem a mania de rotular tudo. Lembro em 2006 que rotulou os jogadores Ronaldinho “gaúcho”, Ronaldo “fenômeno”, Kaká “príncipe” e Adriano “imperador” de quadrado mágico e , de fato, mostraram que de bola eles entendem: o 1º pisou na bola, o 2º fugiu dela, o 3º conseguiu que ela não o visse e o último não conseguiu vê-la. Ademais, também entendem de mágica: fizeram desaparecer nosso futebol.
Atos de vandalismo verificados nos estádios de futebol estão nos levando à liderança de países cujos torcedores são os mais covardes do mundo. Muitas vezes exalta nessas pessoas o ódio reprimido, entorpece a consciência e belisca os sentimentos de crueldade que estavam adormecidos.
Todos sabemos que uma multidão enfurecida comumente comete excessos e derrama sangue. Deu o que der, dane-se. Só após o seu retorno à calma e ao raciocínio, passada a excitação que a empolga, é que acorda do pesadelo sofrido aquele que, ao seu contato, se tornou criminoso.
A ideia de torcida única neste momento e neste cenário é exatamente igual à tristeza: “pode ser intensa, mas jamais será eterna”. Em outras palavras: é necessário que não transforme um covarde em um criminoso covarde, em vagabundo em um criminoso vagabundo, em um atrevido em um criminoso atrevido. E para isso ela, a torcida única, é necessária. Não será eterna, mas prudente enquanto perdurar a insensatez.
Enquanto isso as autoridades e os homens de bem responsáveis, devem agir para destruir de vez a violência nos estádios de futebol, afinal esporte é vida, é cultura, é lazer, é saúde. É preciso, então, para que as torcidas voltem a dividir os estádios, que os diversos segmentos da sociedade civil se conscientizem da sua importância e atuem. A sobrevivência do futebol depende disso. Basta que cada um faça a sua parte.
Deixo aqui minha humilde contribuição: identificados os criminosos organizados deverão para evitar a pena de prisão pelos crimes de lesão corporal e rixa cometidos comparecer na carceragem das delegacias 3 horas antes dos jogos de seu time e ali ouvir palestras ( cansativas ou não) e só sair 3 horas depois dos jogos. As palestras poderão ser feitas por comissões de direitos humanos, padres, pastores e até detentos mais experientes.
Leia também:
Querido Professor Guaracy Moreira, primeiro obrigado pela honra de escrever esta coluna para o No Ângulo. Segundo: concordo com a sua posição. Apesar de lamentar que o nosso futebol tenha chegado a este ponto, o fato é que ele chegou. Claro que o ideal seria que as torcidas convivessem em paz, desfrutando daquela rivalidade saudável e todo aquele papo. É óbvio. Assim como me parece evidente que aceitar a condição de torcida única é quase como assinar um “atestado de incompetência”, de falência da nossa sociedade. E é exatamente isso que eu proponho: que não tapemos o sol com a peneira, que assumamos essa nossa fragilidade. Em outras palavras, defendo que até que haja uma ação conjunta de conscientização entre todas as partes que “fazem” o futebol (Poder Público, CBF, Federações, clubes, torcidas organizadas, torcedores comuns, mídia etc), o mais prudente (apesar de triste) é que os “jogos de risco” sejam mesmo restritos a uma única torcida. Sob pena de testemunharmos mais mortes (seja dentro do estádio, nos arredores, ou nas “conduções”). O que não pode é a gente aceitar essa condição e nada fazer para mudar esse cenário desolador, no qual predomina o sentimento de impunidade. Gosto de pensar que estou fazendo a minha parte ao propor que o senhor, especializado e com vivência na área, compartilhe vosso conhecimento com o nosso leitor (pelo que, novamente, agradeço). Um abraço. 😉
Valeu Fernando, parabéns pelo site,um grande abraço e conte sempre comigo.
PERFEITO!
Sim, infelizmente isso é um mal necessário atualmente. Pena.
Muito interessante, Professor Guaracy Moreira!
Eu realmente não tenho nada contra a torcida única no atual momento. É claro que lamento por chegarmos a este ponto, mas acho que é simplesmente uma reação à absurda situação que vivemos aqui. E o absurdo da situação não é a torcida única, mas sim pessoas morrerem por disputas entre gangues, torcedores não terem coragem de usar a camisa de seus times e estádios ficarem às moscas em clássicos.
Por outro lado, respeitosamente discordo de quando o senhor responsabiliza dirigentes, jogadores e imprensa por “não diminuírem a rivalidade”. Creio que não é nenhuma rivalidade que faz com que essas gangues ajam assim, e que eles encontrariam qualquer outra desculpa. Creio que enquanto não houver punição aos criminosos, todo o resto é acessório. O que o senhor pensa sobre isso?
Um abraço!
Todo mundo ta cansado de saber, que são as torcidas organizadas que causam isso. Por tanto esse negócio de torcida unica não da certo, até fora dos estados eles brigam. O certo era acabar com as torcidas organizadas ou proibir-las de entrar nos estadios, talvez piore a situaçao, mas não custa nada tentar.
eu sou contra pois o espetaculo fica mais bonito com as duas
Sou a favor.. pode ver q depois q ministério público tomou essa medida não houve mais brigas
Eu sou a favor de não ter polícia em estádio. Deixem os animais se matarem. Pai de família parem de ir no estádio. Fique no conforto de suas casas.
Sim
Vai ser quase impossível um time sem torcida vencer o um time q lotou
Melhor sem as duas torcidas, são todos brigões !!
Sim.
Nunca torcida única só mostra a incompetência do estado na segurança publica,aí daqui uns dias vão querer jogos sem torcida???
Não, isso é a falência e a incompetência dos órgãos de segurança
eu sou contra como um time vai ter o apoio da torcida fora de casa .
[…] De modo que, apesar de ter um time mais talentoso, o Santos enfrentará um Palmeiras que é mais competitivo do que ele e que joga em casa, com toda a torcida e retrospecto a seu favor (em razão da medida triste, mas correta, adotada pelo Ministério Público de São Paulo). […]
[…] ano passado, o Professor Guaracy Moreira, especialista no assunto, escreveu um texto para o No Ângulo explicando…. Em dezembro, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Mágino Alves Barbosa Filho, […]