Créditos da imagem: Jean-Christoph Bott AP
As quartas de final da Champions League que se iniciam nesta semana reservam um detalhe curioso. Seu simbolismo é claro, e não pode ser colocado em baixo plano. Pela primeira vez desde que o formato atual de número de participantes por país se instituiu, somente os quatro principais centros do futebol europeu terão representantes na atual fase da competição: Espanha, Itália, Inglaterra e Alemanha. Não é coincidência.
Como fica claro a cada ano, e pela hegemonia evidente que tem se traduzido em repetição de campeões –cujo ponto culminante foi o inédito bicampeonato do Real Madrid no ano passado, para a fase moderna do torneio –a concentração de poder no futebol europeu vai ficando cada vez mais restrita. São as consequências de abertura do mercado comum na União Européia. Enquanto um pequeno grupo de potências arrecada a maior parte dos recursos econômicos e domina os momentos mais decisivos, desta vez até os principais coadjuvantes estão em suas periferias locais, herdando parte dessa supremacia. Temos então equipes como Roma, Liverpool (ex-multicampeão europeu e hoje abaixo dos maiores) ou Sevilla conquistando espaços que já ficaram nas mãos de grandes franceses, portugueses ou mesmo turcos nesse momento da Champions.
É claro que isso não chega a ser uma regra. Bem poderiam ser outros os classificados, de outros países, pois as oitavas de final foram muito equilibradas e hoje poderíamos ter o Shakhtar Donetsk ou o poderoso PSG de Neymar classificados. Mas o dado é curioso.
Um aspecto a ser apontado na geração disso é a revolucionária Lei Bosman. Ela não exerceu um peso tão importante na mudança desse quadro quanto a integração da União Européia, mas facilitou que craques que tinham mais dificuldade em se desfazer de contratos com suas equipes menores pudessem trabalhar em níveis mais altos, ao lado de outros jogadores de seu quilate, gerando superequipes que passaram a praticamente se fundir com a identidade da principal competição do calendário europeu. Os nomes acabaram se tornando sempre os mesmos.
Já se foi o tempo das surpresas do Leste Europeu. Das equipes medianas chegando às finais, dos craques “descobertos” em times de regiões distantes dos polos futebolísticos principais. Hoje, estes não precisam mais de uma Champions League para chegar aos maiores clubes.
As marcas das potências europeias vão ficando mais fortes ano após ano. O aumento na repercussão de suas conquistas, pela frequência cada vez maior, vai consolidando seus nomes e expandindo as vendas pelo mundo afora. A televisão eleva o poder de audiência dos clubes sob taxas exponenciais e aquele pequeno grupo de cinco ou seis times que está nas cabeças do campeonato europeu (os mesmos que sempre disputam o título das ligas mais valorizadas do planeta) vai ratificando sua imagem cada vez mais, ao ponto de criar rivalidades entre torcedores –principalmente o público adolescente –em centros cada vez mais distantes de onde as equipes de fato atuam.
Se isso é bom para o futebol? A criação de titãs é sempre boa para o esporte. Não há repercussão sem grandes feras, sem “Golias” que digladiam entre si na busca pelo topo e funcionam como parâmetros de qualidade, para que os outros briguem para estar entre eles (boa parte da ambição do Grêmio em vencer a Libertadores estava ligada a chegar ao Mundial para ter a chance de se medir contra o “monstro” Real Madrid).
Todos os esportes são feitos de alguns poucos grandes nomes. E quem acaba ganhando com isso no caso atual é o futebol como um todo, pois a maior audiência desses grandes espetáculos incentiva o público a se voltar mais para o evento de maneira geral.
Por outro lado, aonde fica a identidade das regiões? Qual o sentido de um clube local perder seu espaço no imaginário de um torcedor com potencial de retorno comercial para uma supermarca europeia? O mundo vai ficando cada vez mais globalizado e prático de ser acessado. Mas cada lugar continua sendo o mesmo, com suas peculiaridades, culturas locais e rotina. Faz sentido abandonar o estádio e a camisa de futebol do time da cidade para ficar grudado em celular, tablet ou – ainda– a televisão para ver seu herói da TV decidir a Champions League, e discutir Salah, Lewandowski ou Griezmann, enquanto o velho time do coração conseguiu a muito custo um empréstimo bancário ou investidor para trazer aquele belo jogador “sem mercado na Europa”? Onde nós mesmos “terminamos”, e até que ponto a imaginação do que se vê à distância merece tanta importância?
Torcer para grandes marcas pode ser atraente e recompensador (os resultados sempre aparecem). Mas os clubes locais são a extensão de nossas vidas cotidianas, que consomem a maior parte do nosso tempo. Nossa raiz.
Use-se toda essa repercussão de uma Champions League e seus titãs para tornar o futebol local cada vez mais querido e bem tratado. O amante do futebol é o principal beneficiado. Quem sabe logo, logo não teremos uma Libertadores menos debochada e menos vítima de paródias com seu equivalente europeu. Com uma identidade única sem depender de imitações, como a final de um jogo em campo neutro. Com suas tradições respeitadas, e não desprezadas.
Por enquanto, a julgar pelas quartas-de-final da Champions League, esse caminho segue firme no curso inverso.
Essa previsibilidade acaba deixando o campeonato menos atraente.
Verdade
Real, Barça e Bayern deveriam já começar nas semis, porque anda um saco isso!!!!!!!!! Futebol lá é bom dentro de campo nos jogos dessas seleções mundiais!!!!! Porque de resto, é tudo chato e concentrado, sem competitividade!!!!!!!!!!!
O poder financeiro concentra os grandes atletas do mundo.