Créditos da imagem: Montagem / No Ângulo
De olho na bola!
O site me pediu uma análise da primeira rodada até aqui e uma perspectiva da estreia brasileira. Farei ambas sob um enfoque não destacado em nenhum dos comentários que vi, mas que parece absolutamente essencial: as condições de jogo, especialmente a junção campo e bola. Como fã de tênis, sempre entendi a importância de bolinha e piso em qualquer torneio. É até lamentável que não se faça o mesmo no futebol. Um gramado mais veloz ou grudento, bem como uma bola mais leve ou pesada, podem ampliar ou limitar o repertório das equipes. Já tivemos uma Copa praticamente estragada por uma esfera maluca. Deveria ser uma lição eterna para prestar atenção no assunto.
Neste contexto, chamou a atenção como a bola está rolando e quicando bastante. É possível perceber a dificuldade de domínio e também para chegar em passes fortes, além dos chutes que mais parecem “field goals”. Hoje mesmo vimos Musiala e De Bruyne, experts em conduzir a bola e bater de chapa, anotando 3 pontos no futebol favorito dos EUA, em vez de 1 no jogo inglês. Quando as equipes não conseguem se adaptar, o jogo fica restrito a cruzamentos e bate-rebate, como nos insuportáveis 0 a 0. Por outro lado, ao menos França e Espanha já ficaram à vontade, porque têm o que é preciso para transformar o desconforto em vantagem: leveza, velocidade pelos lados e distanciamento curto entre os jogadores. Independentemente da fragilidade dos adversários, a França aproveitou mais a rapidez. A Espanha se deu bem na troca de passes curtos.
Ter jogadores velozes não significa que a equipe é veloz. Os desfalques Pogbá e Kanté representam talento e desarme para a campeã mundial. Mas, juntos, não costumam proporcionar a chegada rápida ao ataque. Os substitutos conseguiram permitir a Dembélé e Mbappé o uso da bola rápida a favor. Por sua vez, tal como em 2010 com a jabulani (que ainda era irregular na trajetória), o estilo de toques curtos espanhol não deixou a bola escapar do controle. Claro que isso só funciona se tiver meio-campistas como Busquets, Pedri e Gavi – que até aprendeu a amarrar as chuteiras (vai que cadarço solto é crime no Catar…). Futebol e Copa do Mundo trazem surpresas; Destaques iniciais não raro despencam a seguir. Mas, em termos de requisitos frente ao cenário de jogo, franceses e espanhóis podem ficar contentes – por enquanto.
O Brasil tem elenco e condições para seguir as duas receitas para lidar com a bola. Velocidade é o que não falta para os extremos Raphinha e Vinícius Jr. A presença de Neymar, Paquetá, Fred e Casemiro tem resultado em facilidade para tabelas de dois ou três. Fala-se que Tite usará Richarlison no lugar de Fred, com Paquetá se juntando a Casemiro no meio. Não é uma ideia que me agrada. A começar, pela noção de que Paquetá é titular absoluto. Para mim, ele seria mais um dos ótimos jogadores que podem começar um jogo, ou não. No futebol de hoje, com o perdão do deboche, ter um onze fixo chega a ser “coisa de pobre”. Usa-se alguns jogadores como titulares em todos os jogos e as demais vagas são objetos de variação, conforme o cenário da partida. Para mim, apenas Alisson, Marquinhos, Casemiro, Neymar e Raphinha deveriam ter esse status.
E Viní? Seria quase sempre titular, mas diferencio de Raphinha por motivo prático. A chegada deste, efetivamente, deu o equilíbrio que faltava ao “mundo maravilhoso de Tite”. A equipe passou a ser perigosa pelos dois lados, algo que faltou em 2018 e nas Copas América. Eventual ausência do barcelonista poderia trazer de volta um problema superado. De todo modo, quando não puder jogar, Antony deve substituí-lo por semelhança de estilo. Voltando a Paquetá próximo a Casemiro, não aprecio porque não é como joga nos clubes. Faz parte dos quatro jogadores de ataque (na ponta-de-lança) que se tornaram praxe tática. Bruno Guimarães atua na mesma função de Fred, como destaque criativo do Newcastle. Improvisar outro por quê? E logo contra uma seleção europeia, tipo de adversário que o Brasil não enfrentou nos últimos quatro anos e meio.
A falta de intercâmbio com a Europa é o principal obstáculo da seleção. Relativizar isso é outra preguiça mental. Porém, enfrentar duas equipes médias como Sérvia e Suíça é o teste que, bem executado, suprirá esta lacuna para as fases seguintes. Por isso a seleção brasileira precisa entrar muito bem concentrada. Tanto pelo estilo dos adversários, quanto pelas particularidades acima mencionadas. Futebol se joga num campo, com uma bola. Se levar um baile dos dois, não precisa nem de rival para fracassar.