Créditos da imagem: Wagner Meier/Getty Images
Novo relato coloca conclusão anterior na marca do pênalti.
Quando o jornalismo enfim é realizado com uma fonte confiável, a visão de um caso pode mudar. Até a coluna passada, trabalhei com os fatos divulgados pela defesa do então jogador Cuca. Horas depois começou a circular notícia de jornal suíço mencionando o julgamento. Não dei valor porque estranhei a riqueza de detalhes sobre um julgado de feito em segredo de Justiça. Porém, a entrevista do advogado da vítima ao UOL, na tarde deste dia 25, traz relato contrário de quem realmente participou do processo, confirmando os seguintes pontos:
1 – o jogador foi condenado por dois delitos – coerção e envolvimento em ato sexual com menor. A inclusão deste segundo crime – coerção – indica que no mínimo a vítima foi coagida a permanecer no quarto contra sua vontade.
2 – perícia médica apontou esperma de Cuca no corpo da vítima. Este ponto considero relativo porque não é explicado se o exame foi de DNA (bem incipiente em 1989), sendo que qualquer outro teria precisão obviamente inferior. De todo modo, parece ter sido considerado na decisão, pois do contrário o mais provável é que, para evitar condenação dupla pela mesma conduta, o julgador optasse entre coerção ou o envolvimento em relação sexual.
3 – a vítima reconheceu Cuca, ao contrário do que ele e seus advogados afirmaram durante todos estes anos. Este reconhecimento reforça o resultado da perícia e, consequentemente, a condenação pelo ato indicado pela prova.
O que isso muda na análise do julgamento? Muita coisa. O elemento da coerção, somado à relação sexual em si, já teria sido suficiente para que, se o ato fosse realizado no Brasil ao tempo dos fatos (1987), houvesse a possibilidade de tipificar estupro. Aos olhos de quem analisou os fatos com decisão transitada em Julgado, houve ameaça e ato sexual. Estupro, em nossa Lei, já abrangia manter relações mediante grave ameaça. Não me parece descompensado inferir que uma mulher, impedida de sair de um quarto por pelo menos quatro pessoas, veio a se sentir gravemente ameaçada.
Ainda que Cuca não tenha mantido a relação sexual, ter feito parte do grupo que coagiu a vítima não alteraria a classificação penal. Apenas mudaria o agente de coautor para partícipe, estando ambos sujeitos às mesmas penas e à mesma norma se o caso ocorresse no Brasil (sempre bom grifar isso). Neste contexto, embora Cuca não tenha cometido o crime de estupro pela Lei Suíça, não é descompensado dizer que praticou ato condizente com estupro pela legislação do nosso país – ao tempo dos fatos (outro grifo importante para repetir).
Infelizmente, tal como no caso Robinho, até há pouco a informação disponível era apenas a divulgada por advogados do condenado. Tanto que o Santos já havia recontratado seu ídolo, até o dia em que jornalista do SporTV, provavelmente por conta própria, foi atrás do processo para rebater a versão de que a condenação era injusta e seria revertida em apelação. Apelação esta que, no que tange a Cuca, nem é mais possível. Assim como não é mais possível ser punido – houve prescrição da pena de quinze meses, agora mais estranhamente pequena.
Sendo assim, ante estas revelações que contrariam a versão única até dias atrás, Cuca e seus defensores devem explicações – inclusive com a oportunidade de apresentar documentos sobre a sentença que, eventualmente, contrariem jornal e advogado da vítima (provavelmente a fonte do jornal). O silêncio, agora, tornará sua carreira insustentável. Não por lacre, mas como resultado de uma mentira de alguém que agora se cala.