Créditos da imagem: Divulgação/Grêmio
Sempre que um time tem oscilações de desempenho, ou vai mesmo mal, a chuva de críticas é farta, claro. E, incontinente a isso, tão precipitadas quando repetitivas, surgem as esperanças em jogadores jovens de notório potencial. Não vem sendo diferente este ano, no Grêmio. Com uma equipe que transmite lentidão na passagem da bola entre o meio-campo e o ataque, é grossa a massa de detonadores do veterano Douglas, meia do tipo “superclássico”, de aparente pouca movimentação e toques categóricos e pontuais. Tipo que dizem que “não tem mais lugar no futebol moderno”.
O entendimento dos contrários ao Doga10 (como ele mesmo se auto-denomina) é o de que cada vez estão mais raras as jogadas isoladas que justificariam sua permanência no time – se é que ainda existiriam. E de que ele atrapalha a metodização do esquema tático implantado por Roger, por viver seu próprio universo em campo, alheio à movimentação. Senhor grisalho, soberbo e teimoso, que não estuda em casa as lições de amplitude, vitória pessoal, circulação de bola e marcação em blocos alto, médio e baixo (faltou algo?).
E aí vem o resíduo citado: surge há um ano no elenco o jovem meia Lincoln, de características praticamente idênticas às do veterano. Porém com idade pra ser seu filho. Promovido por Luiz Felipe Scolari ainda antes de completar 16 anos ao grupo principal, hoje com 17, depois de uma temporada de aprendizado, é considerado opção inadiável para já. Um erro.
Erro, porque este filme já foi visto muitas vezes. É romântico; a invocação do sangue jovem identificado com o clube e com a motivação no nível máximo, para saída do medalhão acomodado. O craquezinho da torcida que irá resolver o problema. Mas o esperado quase sempre não acontece. O desempenho de um jogador muda completamente entre ele atuar em partidas de nível mais baixo, quando está entre os reservas, com menos pressão, e atuar sob a responsabilidade de fazer o mesmo que os experimentados titulares já seguem. Detalhe: não esquecer que incluem-se aí todas as colaborações táticas e morais que influenciam diretamente na performance da equipe. As ocupações de espaço sem a bola, o reposicionamento rápido, a cobertura de companheiros, o equilíbrio emocional que garante consistência durante todo o jogo. E tem a maior preparação do adversário de alto porte. Isto tudo entra na conta e o jogador jovem tem que absorver. Caso contrário, sucumbe e o time pode até mesmo ficar com 1 a menos em campo. Eu já vi essa história tantas vezes que nomes não faltam, para comparar.
Douglas está longe de ignorar todos os predicados citados. Parece sonolento e disperso, verdade. Mas cumpre todo o resto. Cerca a saída de bola do adversário, ajuda na recuperação da bola fazendo isso. Não sente mais pressão alguma nas partidas – até pelo seu jeitão malemolente – e ainda contribui no controle emocional da partida. Vez que outra arranca cartões do adversário e até uma expulsão já cavou, na partida contra o Toluca, no México. E, sim, lança. Lança muito. Já vi Everton desperdiçar muita chance de gol proporcionada pelo barbudo em partidas encardidíssimas. Um jogador que aparece pouco, mas que aparece decisivamente, é utilidade real numa competição intensa onde espaço é item raro de colecionador.
Por outro lado, Lincoln, claramente um projeto de craque, de canhota segura, com batida facílima na bola e visão de jogo de veterano, mal sabe se posicionar em campo. Ainda delira com jogadas diferenciadas, traço típico de jogador em afirmação como profissional. Vive seu sonho particular em campo, preocupa-se – naturalmente – com seu brilho, em mostrar seu talento. E isso o cega para o contexto da partida que se desenvolve ao seu redor. Campeonato estadual só serve como parâmetro quando convém. Quando um sonho de um torcedor desesperado quer atropelar a razão.
Conversa mole? Boleiro bom tem que jogar sempre? Querem pagar pra ver mais uma vez? Eu já gastei o que tinha nisso.
Mas o mais objetivo: os problemas crônicos do Grêmio NÃO estão em Douglas. A grande deficiência do time para chegar nas conclusões tem no meia justamente um alento. É ele quem consegue quebrar o bloqueio defensivo adversário com suas jogadas esporádicas de talento.
Lincoln tem vez neste Grêmio. Mas deixem-no entrar para fazer algo diferente num momento de agonia. Como na partida na Argentina contra o San Lorenzo. Foi um retrato perfeito. Entrou no final, com o adversário já cansado e ainda desprevenido contra o talento de um jovem incipiente. Uma falta, um lance de efeito, uma alternativa a Douglas para quando o jogo estiver “tenso” para sua criatividade – e também seu pulmão. O diferencial do garoto sem compromisso. Entregar-lhe uma camisa de titular no lugar de um jogador que não está no núcleo das deficiências crônicas do time é criar mais um problema, e não eliminar.
Muito interessante o seu ponto de vista! Eu acho o Douglas muito perseguido. Se realmente fica devendo em alguns pontos, como dinamismo e versatilidade, é um dos meias mais talentosos do Brasil, capaz de jogadas atualmente raras nos nossos gramados.
O Gremio teve foi sorte. Se não fosse a boa atuação do goleiro, ía ser uma goleada.
RAPAZ, acho que nunca tinha concordado com a íntegra de um texto antes na minha vida..
aplaudiria teu texto. parabéns
“Lincoln tem vez neste Grêmio. Mas deixem-no entrar para fazer algo diferente num momento de agonia. Como na partida na Argentina contra o San Lorenzo. Foi um retrato perfeito. Entrou no final, com o adversário já cansado e ainda desprevenido contra o talento de um jovem incipiente. Uma falta, um lance de efeito, uma alternativa a Douglas para quando o jogo estiver “tenso” para sua criatividade – e também seu pulmão. O diferencial do garoto sem compromisso. Entregar-lhe uma camisa de titular no lugar de um jogador que não está no núcleo das deficiências crônicas do time é criar mais um problema, e não eliminar”. Muito bom! 😉
Esse Lincoln no Football Manager é um monstro