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Evitei a mídia esportiva depois da eliminação. Não suporto as apelações clássicas por curtidas, como a do “time sem alma”. Mas descobri que o Chavão FC perdeu terreno. O responsável pela derrota seria um certo Fortuito. Resolvi rever a escalação belga. Como suspeitava, não tem ninguém com esse nome (pronuncia-se “Furtuát”?). Talvez fosse tradução flamenca. Também não. Aí constatei minha ingenuidade. O Brasil teria perdido por azar (não Hazard). Isso mesmo. Tite virou o único absolvido com tal fundamento. Bem diferente dos antecessores.
Na Copa de 2010, a seleção de Dunga espremia a camisa laranja. Até que um bizarro gol contra desandou tudo. Nem por isso creditaram a virada ao craque Fortuito – na época holandês. “Ah, mas o Brasil vinha bem pra caramba com Tite! Liderou na primeira fase e ganhou de 2 a 0 do México!”. O Brasil de Dunga também foi líder e ganhou de 3 a 0 do Chile, liquidando a fatura no primeiro tempo. “Ah, o Brasil de Tite foi líder das eliminatórias!”. O de Dunga também. Mais: o Brasil de Dunga ganhou as duas competições profissionais (Copa América e Copa das Confederações) que disputou. Nem por isso o técnico, capitão de um título mundial e titular em três Copas seguidas, teve boa vontade absoluta. Pelo contrário. A culpa foi sua por não levar Neymar. O mesmo Neymar que tentou, mas não conseguiu superar o triunfante Fortuito. Será que esse ganha a Bola de Ouro?
Fortuito é tão internacional que, além de Bélgica e Holanda, tem ascendentes em tudo quanto é canto. Nem assim foi chamado de herói nas vitórias que comandou. Em 1950, por exemplo, apareceu no ataque uruguaio pra enganar o goleiro Barbosa. Os jornais brasileiros falaram em Ghiggia, frango, covardia do Bigode, macheza do Varella, etc… Fortuito, que já era bom, nada. Deve ser por isso que, magoado, não voltou pra defender o título celeste em 1954. Perderam pra Hungria. Há quem diga que tinha um primo seu na Alemanha, que surpreendeu na decisão. Por aqui, assim como Barbosa foi condenado até a morte, a dinastia Fortuito seguiu solenemente ignorada. Isso até dia 8 de julho, quando enfim brilhou. Tite não é só encantador de serpentes – como disse o super-ultra-hiper-mega-power-intendente Lugano. Também faz ver os invisíveis.
Fortuito pode mesmo decidir. Mais que muito protagonista milionário, dirão os maldosos. Apenas receio que, também como outros festejados, não foi tudo isso. Houve risco na estratégia belga. Mas não acaso. E, pra que o risco compensasse, houve um adversário que ajudou. Um time que só sabia jogar por um lado. Assim dá pra marcar com sete, concentrando a defesa no setor perigoso. Por 15 minutos o Brasil jogou pelos dois lados. Fez um e quase empatou. Imaginem por 45. Deixaria a vida belga mais difícil. Podia perder do mesmo jeito? Podia. Só que Fortuito teria que correr três vezes mais pra fazer a diferença. Quem sabe até saísse lesionado, como Fred. Que nem pôde entrar no lugar de Paulinho. É, aquele que foi ídolo em Barcelona num semestre e, no outro, mandado de volta pra China. Vicio redibitório por toques de lado e uma jogada só.
Mas voltemos e encerremos com F18 (já dei apelido). Já disse ser contra massacres histéricos e saudosistas. Por outro lado, se tiver que escolher entre caça às bruxas e botar na conta da sorte, fico com a primeira. Menos desonesto que induzir menores de 40 anos a crer na repetição de 1982. Na época não tinha Fortuito. Tinha Paolo Rossi. Cerezo não recebeu dó de ninguém. Muito menos o técnico foi poupado. Só deixou de ser “pé frio” dez anos depois. Não vão corrigir condenações brutais do passado com absolvições totais no presente. Ou então só tem um jeito: Tite convocar Fortuito em 2022. Se não pode vencê-lo…
Bruno Bertazzi
[…] de lado, o que tornou as equipes parecidas entre si e ampliou o papel do aleatório. Inclusive, como ressaltou Danilo Mironga, serviu até como desculpa para a consagração do craque Fortuito como responsável pela […]