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Super Bobagem – influência norte-americana nos grandes europeus tem mais cara de Brasil
O ano era 1987. Após turbulento Brasileirão com mais de 100 clubes, a CBF não tinha dinheiro para organizar a nova edição. Sob o pretexto de moralizarem o futebol do país, os então chamados grandes fundaram o Clube dos 13 e anunciaram a primeira Copa União. 16 clubes – os 13, mais 3 convidados. Sem rebaixamento. Sem o vice-campeão do ano anterior, o Guarani (que tinha uma conquista no currículo). Em 2000, nova tentativa – a Copa João Havelange. Com o Fluminense, então na série B, alavancado ao grupo de cima. Em 1987 houve bem mais aplausos que em 2000, mas o princípio foi o mesmo e parece ter chegado à Europa. Americanizado, mas chegou. E trazendo lá a reação que faltou aqui: nojo.
A Super Liga é uma ofensa esportiva em todos os aspectos. Quer um torneio europeu de participantes fixos, transformando a Champions League em critério para convidados. O futebol europeu ampliou seu desenvolvimento com o torneio que, originalmente, só tinha o campeão de cada país – daí o “champions”. A ambição financeira ampliou leque com os não-campeões, mas classificados por desempenho. Agora querem que a presença dos maiores seja compulsória, independentemente do que estes fizerem nos campeonatos nacionais. Acreditam ser possível, num exemplo de rara ignorância, que as ligas nacionais se tornem uma espécie de “college”, na visão americana, ou campeonato estadual, na nossa. Como se as torcidas não se importassem. Mais: como se os jogadores não se importassem.
“O senhor combinou com eles?”, pergunta que Garrincha teria feito a um treinador, poderia ser endereçada aos “super-dirigentes”. Não parece que os atletas estejam radiantes. O que leva a outra pergunta: quem garante que vão querer participar disso? Ainda mais se UEFA e FIFA levarem adiante a possibilidade de impedi-los de jogar por suas seleções. Estaria Messi disposto a renovar com o Barcelona e arriscar sua última Copa? E Cristiano Ronaldo? E, mesmo tendo outras possíveis participações, outros craques no auge da produtividade? Há também a chamada cultura esportiva. A ideia de um campeonato de pura elite toma goleada da UCL nos sonhos destes jogadores. Os clubes – e investidores – excluídos sabem disso. Podem criar fundos para tirar tais astros da Super Liga, gerando leilão sangrento que arrebentará seus custos.
Juridicamente, a despeito de algumas pérolas proferidas por aí, a Super Liga tem chances ínfimas de prevalecer nas Cortes Judiciais. Soa como uma revolta cínica, de cubes que há praticamente um século aceitam a estrutura. Há mais que um “contrato de adesão”. Há estatutos ratificados e respeitados há décadas. Só existe futebol profissional, legalmente, quando há a chancela da FIFA, das Federações Continentais e Federações Nacionais. As ligas nacionais só foram possíveis por acordo dos clubes com as Federações. O otimismo dos dirigentes com a parte jurídica faz pensar que a ganância e o desespero (pelos prejuízos da pandemia) os fizeram perder todas as noções. Chegar ao Judiciário falando em “liberdade contratual” e “tempos modernos” tem tudo para render uma porta na cara. Erraram de continente e de país.
Falando em termos práticos, a Super Liga teria um efeito bem diferente do sonhado. Os jogadores têm no primeiro semestre uma chance de respiro. São as poucas semanas cheias para recuperação e treinos. As chaves dos torneios continentais não exigem a plenitude de preparo e concentração. Assim, é possível administrar a preparação até o sprint entre janeiro e maio. A SL quebraria este equilíbrio gerando pico de exigência desde setembro. Não bastasse o aumento de lesões, viria o “efeito carne de vaca” alertado por Klopp. A incerteza de enfrentamento amplia a expectativa pelos grandes confrontos internacionais. A certeza de que se enfrentarão todo ano esfriará o interesse, em pouco tempo. Riscos que, aliás, também estão presentes nas modificações anunciadas para a Champions League – falaremos em outra ocasião.
Muito da situação do Brasil se deve ao fato de que, há pouco mais de dez anos, decidiram consagrar o estilo Eike Baptista. O empresário, tratado como campeão até pelo governo, tinha a estratégia de dar a melhor hipótese como certa, mesmo que improvável. Convenceu a muitos e levou estes muitos a enormes danos econômicos. A Super Liga parece isso. Só pensaram no cenário dourado, incluindo a estimativa de que o público vibraria com o anúncio. Confundiram euforia com perplexidade e indignação. Mais incrível foi o banco JP Morgan ter entrado nessa. O patriarca deve estar se revirando no túmulo e os donos atuais devem dormir de luz acesa. Se não por medo de fantasma, de pesadelos.
Quem bolaram essa ideia de jirico de unir o inútil com desagradável da “Suprema Liga”, devem se acharem o último pastel da feira. Aproveitem e deem um abraço de urso ao Bartomeu, que é a cara dele de também fazer preserpada.
E o texto do Gustavo é mais esclarecedor do que li e assisti sobre o assunto.
E a tentativa da Suprema Liga de impertrar contra as Federações, UEFA e FIFA é apagar fogo com gasolina.