Créditos da imagem: Montagem / No Ângulo
É melhor o silêncio que certas defesas. O Cruzeiro e sua SAF vêm constatando isso nas últimas horas. Não bastassem os clichês para justificar a rejeitada permanência de Fábio (sobrou até “direito aos mil jogos”), algumas explicações supostamente negociais para a decisão não fazem senão desinformar. Chega-se ao ridículo de explicar, com pompa de expert, que Fábio está sendo dispensado porque está velho e, portanto, não daria lucro numa revenda. Sim, o jornalista ainda vê clube-empresa como nos tempos da Parmalat no Palmeiras – literalmente no século passado.
Menos mal, para quem pretende se informar, que em seguida Cesar Grafietti escreveu no Twitter para rebater a imbecilidade. “Clube de futebol não visa lucro, nem na SAF. Quem investe busca ganhar dinheiro com formação e negociação de atletas ou com o crescimento esportivo, que leva ao aumento de receitas e valorização do clube, para ganhar dinheiro numa venda futura.” Para quem não compreendeu ainda, Ronaldo tem um objetivo claro e óbvio ao se tornar acionista majoritário de clubes como Valladolid e Cruzeiro: comprar na baixa e vender na alta. Não apenas em termos de divisão disputada, mas em estrutura e potencial. A ideia é fazer com que ambos tenham os departamentos ajustados para que, quando retornarem à elite nacional, permaneçam de forma duradoura e competitiva. Sendo que, no caso do clube mineiro, o desafio é muito maior.
Quando assumiu o controle do Valladolid, o clube espanhol se encontrava financeiramente bem. Já a estrutura do futebol, segundo Ronaldo e assessoria, estava arcaica como a de diversos times brasileiros. Sendo assim, os esforços se concentram nesta parte. Com o Cruzeiro, nem os dois anos de série B (sim, DOIS ANOS, fora a próxima temporada) serviram para se repensar de verdade a gestão. Foi mais como aquela resolução de reveillon que fica sempre pro ano que vem. A sequência foi praticamente a mesma: contratação de um nome decadente de peso (normalmente com passagem no clube), apelação desesperada a um técnico de passado glorioso e, com a série C dando as caras, um esforço de base para tornar a permanência na segundona um prêmio de consolação. O mais espantoso é que diretoria, imprensa e torcida ainda se perguntaram: “o que deu errado?”.
Pelo que se especula, Ronaldo chegou a repensar após ver que os débitos eram piores que os informados. Aparentemente, decidiu seguir com os planos, porém acentuando as medidas desagradáveis. Não vai simplesmente dar quatrocentos milhões para o Cruzeiro fazer o que quiser. Seu sucesso romântico não é ligado a beleza e inteligência, mas tampouco é burro. Sendo assim, dispensou dois ícones ligados a reforços caros ou duvidosos: o gestor Alexandre Mattos e o técnico Vanderlei Luxemburgo. Também suspendeu ou cancelou as contratações que estavam realizando. A folha de pagamento será reduzida e só jogará quem se enquadrar nela. Mas só isso não basta. Para denotar a seriedade total, é preciso dar um recado sobre a mudança de rumo de quem caminhava para o abismo e queria, pasmem, dar um passo à frente. É onde entra Fábio. Ou melhor: sai.
Fábio esteve presente em conquistas marcantes. Por outro lado, a maioria delas veio com uma filosofia kamikase que, mais cedo ou mais tarde, deixaria qualquer clube em crise. No caso do Cruzeiro, o mais tarde deixou as coisas ainda mais trágicas. Fábio foi o capitão e líder dos atletas neste tempo. Conviveu com tudo o que acontecia, incluindo os problemas de elenco. Tal como Rogério Ceni em seus anos finais no gol, virou parte integrante do ambiente falido no clube. No caso do são-paulino, sua permanência era um endosso ao juvenalismo golpista. A liderança de Fábio não trazia qualquer efeito e ainda bateu de frente com quem mexeu com o status quo – incluindo, por coincidência, o já treinador Rogério. Voluntariamente ou não, é parte do que precisa ser dispensado. Assim entenderão que, de fato, nada pode ser como antes na Toca da Raposa.
Não é possível afirmar o grau de qualidade e sucesso do controle acionário de Ronaldo. O Valladolid ainda está na segunda divisão e lutando pelo acesso. Porém, definir o que deixar para trás é um primeiro passo muito bom. Faltou delicadeza? Talvez a atitude do jogador, desabafando em público em seguida ao fim da negociação, não tenha dado tempo para algo melhor. “Mas e os mil jogos? E nem uma partida de despedida?”. Um clube na situação do Cruzeiro está em clima de comemorar mil jogos de um atleta ou fazer despedida? Senso de ridículo também é requisito do futebol profissional. Isso também vale para “formador de opinião”.