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Não trabalho com jornalismo. Basta ler minha descrição no site para constatar. Porém, pratico jornalismo como amador. O que não quer dizer que o amadorismo me dispensa dos deveres de um bom jornalista. Não me dou licença para mentir, tampouco usando as colunas para iludir leitores. Jornalista que se preze não é animador de auditório e não confunde ponderação com ficar em cima do muro. Isso também inclui a postura perante fatos que, mesmo particulares na superfície, envolvem consequências ao objeto de notícia. Como, pois sim, a vida privada de um atleta de futebol quando esta afeta não apenas a si, como o futebol em geral.
Neste contexto, não apenas discordo, como lamento e me oponho frontalmente a determinada postura em defesa de Neymar. Não à ideia de defesa, mas um infeliz argumento. Na tentativa de rebater patrulhas, chega-se ao extremo de exaltar e restringir o que seria “curtir a vida”, retratado necessariamente como cair na gandaia e não poupar o corpo de nada, porque “tem mais é que aproveitar”. Como se o atleta que faz diferente fosse um trouxa, que não sabe o que é viver. Constituir família ou simplesmente ser mais reservado também são formas de curtir a vida, com uma vantagem profissional: proporcionam maior duração da carreira, em melhor nível. Não por acaso, é o perfil de quem, seja ou não de futebol, manteve e mantém alto padrão por mais de uma década. A não ser quando lesões não permitem. Mas não sem tentar até o fim, como fizeram Andy Murray e o brasileiríssimo Guga.
Pergunto aos leitores se o jogador de futebol americano Tom Brady, muito bem casado e com inéditos seis Superbowls, não sabe aproveitar a vida. E os tenistas Federer (que ganhou seu último Grand Slam com 37 anos), Nadal (superando lesão atrás de lesão) e Djokovic (ressurgido das cinzas para ganhar tudo outra vez), seriam bobos por não largarem tudo? O mesmo vale para o próprio futebol, em que os dois maiores jogadores vão fazer o possível para a derradeira chance de uma Copa do Mundo, daqui a três anos. Nenhum deles está abrindo mão de sua felicidade pessoal. Pelo contrário. O esporte faz parte desta felicidade. Não querem chegar aos quarenta anos pensando “poderia ter mais grandes jogos e sentido mais a adrenalina”, em vez de “poderia ter c… mais mulher”. O que é mais provável aos quarenta? Ficar impotente ou não conseguir correr atrás da bola como antes?
“Quem é você pra dizer se o atleta tem que ser um Brady ou um Ronaldinho?”. Não sou ninguém para ditar comportamentos. Mas sou um colunista que tem a obrigação de observar o impacto que a sequência de “curtidas de vida” provocou no futebol brasileiro. Se Ronaldo, Ronaldinho e Adriano não tivessem perdido o foco da carreira tão cedo, teriam sido suportes para outros nomes forçados a tocar o barco amarelo antes da hora. Como o próprio Neymar, que se tornou o número 1 da Seleção com menos de 20 anos. Ok, nenhuma pessoa tem autoridade legal ou moral para mandar que “apreciem a vida com moderação”, mas isso não significa licença para enganar, dando a entender que a escolha não trará consequências. Já trouxe. Para agir como amigos irresponsáveis, existem os “parças”. Alguém precisa ser o cara do conselho chato.
Sob tal ótica puramente jornalística, apenas dizer “deixem fulano em paz” é insuficiente, porque dá ao destinatário (vulgo público) e ao próprio personagem da notícia uma falsa noção. É preciso, na verdade imperioso, mostrar que a escolha é 100 % do jogador, mas terá efeitos que ele deve considerar, antes de exercer seu sagrado livre arbítrio. Apontar exemplos de quem foi feliz sem deixar de poupar o corpo para a carreira durar mais tempo. O que um jornalista responsável não pode fazer é fomentar dicotomias fantasiosas e indulgentes. O público e o atleta têm o direito de entender que a suposta “alegria de viver” de agora pode virar uma frustração perigosa, quando finalmente se entender que acabou tudo e não tem mais volta. O que a indulgência coletiva trouxe de bom a Garrincha? Depressão e cirrose?
Registre-se que Neymar ainda não chegou a este desinteresse. Para mim, segue o terceiro melhor jogador do mundo. Só que as condições deixaram de ser tranquilas e favoráveis. Saiu do Barcelona para não acompanhar lateral, mas é o que está fazendo depois que Mbappé explodiu. Se quiser ser protagonista em outro clube, várias portas fecharam. Caso mantenha determinadas condutas (como o drible de pura provocação, que ajudou nesta nova fratura), criará dificuldades a si mesmo. Precisa saber disso. Pelos amigos de hoje é que não saberá. Se os jornalistas quiserem ser mais legais que jornalísticos, aí mesmo que será passageiro da “feliz ignorância”. Não o deixemos em paz! Ele merece mais que tapinha nas costas.
PS: poupem-me de responder com “dizem que fulano é família, mas nem tanto”. A coluna não é moralista, muito menos fofoqueira. O que aborda é o atleta que preserva o corpo em relação a outras escolhas individuais.
LER, EXCELENTE.
Fiquei na dúvida se seu texto é favorável ao jogador Neymar ou contrário a ele.
O admirável colunista ( que nem jornalista profissional é) disse tudo que eu e milhares de outros torcedores pensamos. Neymar, infelizmente, devido a sua imaturidade e pessoas próximas, jamais será o melhor jogador do mundo. Não se vê ou se ouve falar da vida pessoal de Messi e Cristiano Ronaldo. Aproveitar a vida, para eles, parece ser sempre o Produzir em Campo. Nossa eterna “promessa”, ao contrário, insiste em seguir o caminho indicado pelos parças. Pena…
Pessoas bem sucedidas tem talento e estrutura familiar.
Farra, amigos………sempre geraram talentos fracassados.
Telê Santana sempre orientava os jogadores, familiares.
Se o Neymar nāo acordar e se estruturar logo logo vai
ser mais um dos exemplos de fracasso.
[…] que existem leitores que discordam com educação, prometi complementar a coluna passada sobre Neymar. Como procurei deixar claro, aquele texto se dedicou a desconstruir um mau argumento usado em sua […]
Your point of view caught my eye and was very interesting. Thanks. I have a question for you.