Créditos da imagem: Friedemann Vogel/FIFA
Mídia esportiva se tornou refém das opiniões de quem trocou o apito pelo microfone
Tudo começou no dia 16 de dezembro de 1989.
Na final do Brasileirão daquele ano entre São Paulo x Vasco, a Rede Globo apresentou na transmissão daquele jogo a figura do comentarista de arbitragem. Arnaldo Cezar Coelho, o pioneiro, estava na cabine do Morumbi fazendo sua estreia ao lado do grande amigo Galvão Bueno.
A princípio, Arnaldo estava ali para avaliar a atuação do árbitro Wilson Carlos dos Santos. Nada muito relevante. O que importava de fato era a peleja entre tricolores e cruzmaltinos, que terminou com a vitória vascaína por 1×0, gol de Sorato.
Com o tempo, novos ex-árbitros passaram o ocupar espaço nas equipes esportivas da TV brasileira. E se tornaram cada vez mais importantes…..
Em um Fla-Flu de 2005, já no auge de sua importância dentro das transmissões esportivas, Arnaldo Cezar Coelho exerceu sua autoridade máxima de dono da verdade e deu uma bronca no ar no então comentarista Sérgio Noronha, por não concordar com a opinião do colega.
Este fato é um marco para o jornalismo esportivo brasileiro. De lá pra cá, cada vez menos os comentaristas e repórteres se atrevem a dar uma opinião relacionada a um lance de arbitragem. É como se todos tivessem se tornado cegos e incapazes de interpretar os lances ocorridos dentro de uma partida. A PALAVRA FINAL É DO COMENTARISTA DE ARBITRAGEM E NÃO TEM CONVERSA.
O curioso é que a grande maioria dos lances que acontecem em um jogo são interpretativos. Com exceção dos lances de impedimento e de gol, todas as decisões do árbitro estão sujeitas a interpretações, e cada um tem a sua. Por mais que, muitas vezes, os comentaristas de arbitragem inventem suas próprias teorias.
O repórter de campo sempre foi o olhar minucioso dentro das transmissões esportivas. Atrás do gol, os repórteres tem o privilégio de acompanhar as jogadas de maneira mais intuitiva. E nem a eles é preservado o direito da manifestação sobre lances polêmicos atualmente.
Separei um lance de um Corinthians x Santos de 1981. Na transmissão da TV Cultura, o saudoso narrador Luiz Noriega acompanha uma jogada envolvendo o zagueiro Joãozinho e o meia Zenon. O juiz Roberto Nunes Morgado marca o penalti, causando profunda indignação nos repórteres que acompanham o lance atrás do gol. Alguns deles são ouvidos pela TV Cultura imediatamente após a marcação do pênalti, entre eles Flávio Adauto, Flávio Prado e Fausto Silva.
Todos foram categóricos ao afirmar que o pênalti não havia existido. Sem o uso do replay, mas com plena convicção. E cá entre nós, o pênalti não existiu mesmo, porém lances idênticos a esse hoje despertam dúvidas. Argumentos para justificar esse tipo de lance são usados sem constrangimento, sendo alguns deles extremamente absurdos como o famoso ‘houve um toque’, ou mesmo o famigerado ‘uso de força excessiva’, passando pelo óbvio ‘houve um contato’. Como se o futebol não fosse esporte de contato!
Com esses argumentos esdrúxulos, os comentaristas de arbitragem começaram a contrariar a lógica do futebol e passaram a confundir a mídia esportiva e os próprios torcedores.
Não à toa, boa parte da programação das emissoras esportivas na TV é calcada nos lances envolvendo arbitragem (muitas vezes mais até do que o jogo propriamente jogado).
Tais polêmicas garantem números importantes de uma audiência cada vez mais confusa em relação aos lances do jogo.
A mídia esportiva se torna cada vez mais dependente das avaliações de ex-árbitros, que se tornaram vedetes do futebol brasileiro atual.
Um verdadeiro desserviço ao esporte…