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No dia seguinte à vitória a fórceps sobre o Sport, que deixou a equipe um ponto acima da zona de rebaixamento, a torcida são-paulina não se preocupou com mais uma atuação ruim. Muito menos com a constatação de que todos os últimos – e poucos – resultados positivos vieram com drama. Tratou de celebrar as defesas que impediram o empate. Fotos e vídeos homenageando Sidão (antes – e provavelmente depois – odiado) foram postados e espalhados por sites e blogs que, sem constrangimento, aproveitam qualquer situação favorável para esquecer críticas. Seria até compreensível, não fosse um padrão de anos. O são-paulino, antigamente tido como o mais exigente (chato, mesmo) dos torcedores brasileiros, foi sequestrado pela mediocridade e se apaixonou por ela. Mesmo torturado em seu cativeiro, basta uma palavra gentil para cair nos braços de sua carcereira privada.
Quando os títulos seguidos dos anos 1990 escassearam, não havia internet disseminada para impor tranquilidade. Mesmo tendo conquistado o mundo duas vezes seguidas, nenhum dirigente ou mãe de hienas falava em “soberano”. O mote era continuar ganhando tudo, inclusive para não deixar que os rivais o fizessem. Quando 1994 acabou com apenas uma Recopa e uma Copa Conmebol de segunda linha, o clima já foi de cobrança. Com 1995 e 1996 piores ainda, virou irritação constante. Mesmo os Paulistões não trouxeram otimismo duradouro. O time podia ganhar mais de cinco seguidas. Bastava uma derrota para ninguém prestar, Denílson ser um firuleiro, Raí um ex-jogador em atividade, França um pipoqueiro, Kaká uma mocinha, Rogério Ceni um loser, etc… Uma torcida insuportável que, pasmem, hoje desperta saudades até deste que vos escreve. Seria menos daninha que a sucessora – a abduzida que grita “o campeão voltou” por qualquer vitória meia-boca.
Desde 2008, o tempo passa e aumenta a falta de auto-estima do encarcerado. Não bastassem os anos achando que os fracassos eram “só uma fase” e vibrando com factoides, os são-paulinos chegaram ao cúmulo de se contentar com “derrotas dignas”. A beira do abismo virou motivo para comemorar que “time grande não cai”, enquanto rivais celebram essas “bobagens” chamadas campeonatos. A perda de noção chegou a tal ponto que o Z4 de 2017 ganhou ares de piquenique no Morumbi. O SPFC tem mais torcedores no estádio hoje que quando ganhou seus principais títulos. Conseguiram inverter o sentido de “torcedor modinha”. Antes era o que só ia na boa. Agora é o que vai na péssima. A beira do abismo virou curtição. Se cair, “melhor” ainda. O objetivo, provavelmente, será superar a média de público de Corinthians e Palmeiras quando estiveram na mesma situação. O refém não apenas beija quem o tortura, como se vangloria por ser a vítima.
Há quem resista a esta paixão. Alguns também já despertaram dela. Mas são poucos, sem articulação e alcance para libertar os outros. Parte deles sequer entende o que levou o clube a este ponto. Falam em resgatar aquilo que, na verdade, levou ao sequestro. Entre 1994 e 2018, o São Paulo terá apenas QUATRO temporadas qualificáveis como vencedoras – poupem-me de dar este status a anos com títulos secundários. Leco é apenas uma subfração destes cinco sextos. O sistema que o criou, bem como os outros raptadores, tem que ser jogado no lixo em vez de refeito. Antes que um blogueiro ou dono de site oportunista arranque as unhas do refém, fazendo-o dizer (prazerosamente) que não vive de títulos, mas de São Paulo Futebol Clube. Seria o desfecho trágico perfeito para uma situação que, pois sim, começou com uma esdrúxula “invejinha” do “bando de loucos” de 2007. Minha sequestradora é mais gostosa que a sua…
E SE PERDER PARA O ATLÉTICO (PLACAR MAIS PROVÁVEL) JÁ VOLTA O DESESPERO…
Entendo o sentido do texto, mas não consigo achar ruim uma torcida apoiar um time numa fase adversa. As cobranças tem que vir, obviamente, mas acho louvável esse comportamento do São Paulino hoje. Muitos elogiam a cultura de estádio cheio lá fora, e eu também acho que é essencial para o espetáculo do futebol
Concordo com você, Matheus. O momento pede apoio e sensibilidade. E as vitórias – quando elas acontecerem – devem vir (apenas) na base da vontade mesmo.
Se por acaso o clube conseguir evitar a queda, que venham – aí sim – as (justíssimas) cobranças.
Tragam um mito para este troféu! Eduardo Oyadomari só li verdades desse carinha aí.
Meu texto vai além do superficial. Mostra que, não de hoje, há uma estranha relação do são-paulino com este cenário medíocre. Quando tem mais torcida na desgraça que no triunfo, alguma coisa está fora da ordem. Inclusive porque a cumplicidade da torcida com esta situação de anos é um dos fatores que levam ao risco atual.
O fato é que o time vive o pior momento de sua história, e precisa mais do que nunca de seu torcedor. Se hoje os estádios estão mais cheios que em 2012, por exemplo, e pq naquele ano estavamos mal, mas não corremos riscos e ganhamos a ridícula serie B da liberta. Mas agora, se nos desanimarmos ou apenas reclamarmos, caíremos. Nossa única chance é o apoio incondicional da torcida.
A torcida do SP só vai na boa mas tá aproveitando que o time tá na rabeira pra tentar mudar a fama ruim Kkkkkkk
Eu estou rindo porque esse é o mesmo cara que falou que não apoiava o time em situação ruim, pois não tinha “culpa disso” e o meu “vai chupando” e “tomara que caia” segue para um torcedor como esse que acha que o clube só merece ser apoiado quando está bem.
O texto, verdadeiro desabafo irresignado com a letargia do torcedor tricolor de hoje, não consegue, ao final, esconder um sentimento – que até parece ter sido criticado no início, mas que foi abraçado no final – dasaparecido do cenário mais recente, revelando – é sutil, mas está lá – que se encontrava (esse sentimento), na verdade, apenas abafado, adormecido – ou escondido –, mas que nunca abandonou o são-paulino clássico: a arrogância.
A mesma que, lamentavelmente – para o são-paulino, claro –, colocou o clube nessa atual situação.
Realmente, concordo com o seu ponto sobre não ser natural o estádio estar mais cheio na desgraça do que na fase boa! Mas isso também não tem a ver com o preço dos ingressos?
De todo modo, acho que as torcidas em geral são muito bobas. Concordo com as críticas que você faz à torcida do São Paulo, mas acho que as outras não são melhores. Quando penso que a torcida do Santos pega no pé do Victor Ferraz e do Lucas Lima, e a do Corinthians no pé do Fagner e do Rodriguinho, diante de tantas outras ruindades, fico bem desanimado 😀
Bem lembrado, com ingresso a 10 reais é mole bater recorde Kkkkkk
Texto perfeito. Enquanto torcedor tricolor não incluo ou tiro uma vírgula do que foi escrito, me sinto representado. Muito bom
Excelente!
Eu acho que parece aquilo de fazer do limão, uma limonada. A fase tá ruim e não temos nada do que nos orgulhar de dentro do campo????!!!! Então vamos fingir que nos orgulhamos do que acontece na arquibancada, kkkkkk
Texto interessante, porém exagerado demais no drama
[…] talvez os são-paulinos cumpram o que prometeram, em especial quando criticaram minhas colunas da “Síndrome de Estocolmo” ou do “Eu Vou Te Abandonar”. Disseram que primeiro incentivariam, mas iriam pra cima da […]
[…] Sim, tais expedientes têm mesmo sua eficácia. Isso porque a torcida são-paulina não lembra mais como é torcer para um time grande – o que equivale a esquecer como andar de bicicleta. Depois de três anos comemorando não-rebaixamento ou vice-campeonato (bem atrás do campeão), não chega a espantar que o comentário de um leitor tenha me indagado como acho que devem cobrar. Desculpem, mas não pretendo ser pai ou guru de torcedor. Antes mesmo dos maiores títulos, a torcida tricolor era conhecida pelo grau de exigência. O finado Mário Sérgio dizia que, quando jogou pelo clube, se não saísse gol em dez minutos já vinha chiadeira. Tudo bem que não precisa chegar a esse grau de ansiedade, nem ao recalque de certas reclamações. Porém, como escrevi anteriormente, esse torcedor enxaqueca tem muito mais cara de um clube com o tamanho do… […]
[…] passado escrevi sobre a síndrome de Estocolmo da torcida tricolor com a mediocridade que sequestrou o clube. A atração fatal requer apenas um […]