Créditos da imagem: Reprodução UOL Esporte
Comecei minha trajetória de torcedor santista lá no final dos anos 80. Minha primeira recordação de jogo assistido na Vila Belmiro foi Santos x Botafogo, em pleno feriado de 15 de novembro de 1990, ocasião na qual o Peixe venceu por 2×1. Eram, definitivamente, outros tempos, de um Santos parado no tempo e que pagaria caro por isso: a minha geração ficaria conhecida pela infeliz alcunha de “Meninos da Fila”, uma alusão aos meninos da Vila de 1978 e tantas outras datas. Minha vivência como torcedor infantil e adolescente não poderia ser pior e mais sofrida. Só veria um título importante conquistado pelo meu clube do coração 13 anos após aquela tarde de domingo de 1989, já adulto (sim, eu estava no Morumbi naquele dia mágico).
Portanto, em relação às gerações mais novas de torcedores do Santos, já posso me assumir experiente. Experiência que nem sempre se traduz em maior maturidade, mas que permite visualizar as inúmeras situações de crise pelas quais o Santos tem passado a partir de mais referenciais históricos. Como disse no parágrafo anterior, eu já vi um outro Santos, radicalmente diferente deste e que parecia parado no tempo, em uma estrutura semi-varzeana digna do final dos anos 60. Vi o Santos treinar na praia, no campo do Santa Isabel (em frente ao atual CT Rei Pelé, então um espaço de campos públicos) e passar inúmeros vexames administrativos e esportivos, de fazer corar de vergonha mesmo o torcedor do time mais amador – alguns episódios, como a contratação do paraguaio Baez, lembravam a várzea, de tão ridículos.
Aos santistas mais jovens e mais velhos, contudo, afirmo sem medo de errar: jamais vi em minha vida situação semelhante à que o Santos Futebol Clube vive hoje sob a (des)administração do presidente Peres. Nada, nem o bingão do Miguel Kodja, em 1994, se compara ao que estamos vivendo, porém isso não quer dizer que não existam paralelos entre o hoje e o passado. Quem conhece a história do Santos sabe que ela é repleta de encruzilhadas existenciais, pontos de inflexão a partir dos quais a Instituição foi chamada a se reinventar, a fim de se manter grande e competitiva. Mesmo a ‘era da fila’ não pode ser compreendida fora dessa clave: 2002 não veio do nada, e sim em parte de esforços iniciados no final dos anos 90, ainda na ressaca do título perdido para o Botafogo em 1995 – de construção do CT, de reestruturação dos departamentos de base etc -, e continuados nos anos seguintes. Ainda que tímidos na época, tais esforços dariam frutos, alguns deles colhidos em 2002.
Não é à toa que submeto o amigo leitor a este lero-lero. A introdução é útil, porquanto vejo no Santos de hoje a mesma situação se repetindo, o mesmo chamamento a uma mudança histórica que definirá o destino da Instituição nos próximos anos – talvez décadas. O modelo anterior, que deu bons frutos e trouxe títulos, esgotou-se e precisa ser sucedido por outro. A questão é: qual? Não tenho uma resposta pronta para essa pergunta, mas uma boa maneira de começar a responde-la é identificar os problemas que nos trouxeram à lamentável situação que vivenciamos hoje (com direito a motim de jogadores e movimentos pedindo a renúncia do Presidente).
Posso até não listar todos os problemas que nos conduziram a um tal desgaste, todavia alguns me restam claros, a saber: 1- sobreposição de projetos de poder pessoais aos interesses da Instituição; 2- lideranças que investem na divisão e inimizade de torcedores santistas segundo a região onde vivem a fim de obter ganhos políticos; 3- falta de envolvimento do santista médio nos assuntos políticos e administrativos do clube; 4- falta de visão das lideranças santistas quanto à exposição do clube (insistimos em vender nossos direitos de imagem a uma emissora de televisão que paga para nos esconder e demonstra não ter espaço para nós em seu projeto); 5- contaminação do processo político por rivalidades que inviabilizam a administração do clube por quem é eleito; 6- terceirização do clube a projetos de treinadores e/ou empresários, prática que contraria os princípios mais básicos da administração; 7- aparelhamento de cargos e funções.
Estes – bem como outros problemas a serem eventualmente identificados pelo amigo leitor – são nada menos que as grandes questões a serem superadas no âmbito desta crise e do processo eleitoral que ocorrerá em dezembro. Neste contexto, chamo todos a participar de algum modo, seja se manifestando nas redes, acompanhando as ‘lives’ dos pré-candidatos, se informando, etc. A ‘participação cidadã’ do torcedor é essencial neste momento. Contribua, dê suas sugestões, associe-se, cobre; não é pequeno o desafio que enfrentaremos a partir de agora. Participe do processo político sendo já a mudança, respeitando quem pensa diferente e desconfiando daqueles que demonizam seus adversários – acredite, eles são parte do problema.
Logo, seja você um santista das vacas gordas dos anos 2000 e início dos 2010 ou um veterano das vacas magras, seja bem-vindo! Ajudemos o Santos a atravessar bem mais uma encruzilhada. “Tamo junto”!
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