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Uma de minhas primeiras colunas para o No Ângulo foi sobre a chatice e a covardia de quem, inconformado com o prestígio da garotada aos campeonatos europeus, ofendia este público com o rótulo de “geração Playstation”. Para rebater, apontei o óbvio: como exigir que gostassem da porcaria que era praticada no futebol brasileiro? Melhor seria que, no lugar de detoná-los, os pais e amigos tiozões passassem a fazer a mesma coisa. Inclusive para exigir, ao menos, a busca pelo mesmo padrão nos times daqui. Há três anos, isso soava polêmico. Agora é trivial. Assim é um debate. Prevalecem os fatos, não os desejos.
Há conclusões que as pessoas tentam evitar, por mais que estejam às portas de suas casas. 2017 já tinha todo um cenário insuportável. Prevalecia o jogo de espera, chutões e placares baixos. Quando um jogo tinha muitas oportunidades, normalmente era por erros defensivos. Assim o Corinthians foi campeão brasileiro. Na Copa do Brasil, a “emoção do mata-mata” se resumia ao pré-jogo. Quando a bola rolava, eram 180 minutos à espera das penalidades. Nada muito diferente da Libertadores da América, adorada pelo que tinha de pior: confusão e truculência. Todos estes “jogaços” costumavam ser precedidos por rodadas vespertinas da Champions League ou torneios nacionais europeus. Naquela coluna, mencionei que era como o UFC colocar seu card preliminar depois do principal. Errei. Card preliminar foi até elogio. Melhor seria pré-preliminar. Ou telecatch.
A exceção era o Grêmio. Com Luan em grande fase (atuando entre as linhas), a revelação Arthur e tocando a bola, o time de Renato Gaúcho venceu a Libertadores fugindo da “receita do campeão”. Mas veio o Mundial. O Real Madrid atravessava um mau momento físico e técnico – tanto que seria surrado pelo Barcelona, uma semana depois. Mas, contra o melhor do futebol brasileiro, controlou as ações sem problemas. O ofensivo Grêmio mal finalizou. Um retrato do abismo de padrões. Ainda assim, houve quem visse o placar apertado, obtido em falha na barreira, como um sinal de que a distância era curta. Estivesse o Grêmio completo (Arthur lesionado e Maicon no banco) e teria sido muito diferente. Chamava-se estado de negação. Tinha que haver outra explicação para o que saltava aos olhos. Não tinha. E surpresa: desviar os olhos não mudaria a foto.
Muita coisa aconteceu desde então. Mais uma Copa vencida por europeus. OK, os atletas da seleção também atuavam na Europa. Mas o técnico não. Falava-se até que, após o hexa, Tite seria contratado por um grande do Velho Continente. Isso nunca teve chance de acontecer. E o motivo seria vivenciado no ano seguinte. Se o atraso nacional era como um Dragão, nada melhor que um Jorge estrangeiro para enfrentá-lo. No caso, dois Jorges. Sampaoli e Jesus foram um choque de realidade. Antes, Renato era visto como o executor da modernidade – marcação adiantada, troca de passes, etc… Um jogo contra o Flamengo e parecia técnico de colégio. Na primeira partida da semifinal da Libertadores, os gaúchos mal viam a cor da bola. Na segunda, não acharam o caminho do vestiário. A verdade realmente estava lá fora.
No Brasil de 2020, a negação de 2017 só pode indicar duas coisas: ou o sujeito é muito desavisado, ou está ganhando alguma coisa com a cegueira. Tem uma terceira hipótese, mas aí estaríamos deixando o terreno da lucidez. O fato é que neste domingo, às 16h, pais e filhos estarão unidos, assistindo à decisão entre Bayern de Munique e Paris Saint Germain. Não serão poucos os santistas e palmeirenses lamentando por “terem” que ver o clássico. Foi-se até o medo de ver os filhos torcendo por um time de fora. Ao menos não seria por um rival doméstico. Nem europeu. Rivalidade intercontinental ficou pra depois. Por enquanto, bem depois.