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A queda de Felipão é a oportunidade para pôr fim a um ciclo que até trouxe frutos, mas que precisa mudar de patamar
Por um incontestável e exemplar trabalho de gestão, o Palmeiras tornou-se destacadamente um dos “milionários” do nosso futebol (ao lado do Flamengo).
A partir daí, saindo da parte administrativa de gestão e marketing do clube, em absolutamente tudo o que envolve futebol o Verdão passou a ser um exemplo do que não deve ser feito. E com a participação da torcida.
A esta altura o leitor palmeirense já deve ter antipatizado com este artigo. Muito provavelmente já tenha pensamentos como “Agora fala isso, mas quando ganhou os Brasileiros e a Copa do Brasil estava bem quietinho”, ou “E o Flamengo, que não ganhou nada, é exemplo?”. E esse modo de pensar, essa postura defensiva e reativa (tal como no campo) é só mais uma comprovação da premissa deste texto. E Corinthians, Cruzeiro e Grêmio também venceram tanto quanto, sem as mesmas condições de investimento.
Na semana passada causou polêmica a declaração de Casagrande sobre o Palmeiras ter se tornado “antipático”. Pois eu não poderia concordar mais com o comentarista global, e vou além: atribuo ao torcedor palmeirense uma boa parte não só da responsabilidade pela “antipatia”, como também pelos recentes fracassos da equipe.
É verdade que a situação é complexa. A vitória ilude, e nos últimos vinte anos o Palmeiras só aprendeu a ganhar assim, “contra tudo e contra todos”, sentindo-se “invejado” e com um futebol baseado na força e pouco elaborado. Por isso, é até compreensível que o palmeirense tenha caído nessa armadilha. Mas se quiserem explorar tudo o que a grandeza do alviverde já possibilita, terão que escapar disso e aprender com outros exemplos positivos.
Tirando os primeiros jogos -quando seu toque pessoal deu um tom que faltava ao bom trabalho tático de Roger Machado- o trabalho de Felipão permite críticas desde o começo. Mas além de ser ídolo histórico do clube, as vitórias cegam, e o surpreendente -pela maneira que foi, “passeando” com o time reserva- título brasileiro de 2018 encobriu muitos problemas. No ano passado faltava uma melhor concorrência, já que o Grêmio estava focado nas copas, o Corinthians tinha sido desmanchado, o Flamengo tinha perdido seu principal jogador durante a competição etc. E sempre que se fazia ponderações aos palmeirenses sobre o futebol rudimentar, o resultado era usado como um escudo intransponível.
Só que mesmo os resultados não eram tão inatacáveis assim. Afinal, não foi capaz de vencer um único mata-mata mais complicado. Ok, é normal perder eliminatórias, mas vencer algumas é obrigatório. E o Palmeiras de Felipão, além do costumeiro desempenho pobre, mostrou-se incapaz de superar qualquer adversário forte. Caiu contra Cruzeiro, Boca, São Paulo (que sequer forte era), Inter e Grêmio. Passou por quem? Cerro, Colo-Colo, Novorizontino e Godoy Cruz (quando, não fosse por um pênalti defendido por Weverton, poderia ter ficado pelo caminho)? Francamente…
Mas para rebater isso, agarravam-se até a argumentos como “melhor campanha da fase de classificação do Paulista”, “melhor campanha da fase de grupos da Libertadores”, dando uma importância desproporcional a jogos irrelevantes contra pequenos, e já tendo uma base montada (enquanto rivais formavam novos times). Muito pouco para o clube de uma diretoria que desdenha do “Paulistinha” (obviamente só depois de ser eliminado).
Se os resultados eram tudo o que importava quando pareciam bons, é natural que agora, na derrota, os palmeirenses tenham que aturar muitas criticas. Afinal, se a vitória é usada como blindagem, se não for na derrota, quando alguma crítica poderá valer dentro desse “fundamentalismo do resultado”?
Fundamentalismo que é base da antipaticíssima frase de Felipe Melo sobre o Santos de Sampaoli, “É bonito ver o Santos jogar, mas já foi eliminado de três competições”. Em tempos politicamente corretos nos quais os profissionais fazem o possível para não falar dos rivais, qual é a razão da frase do “pitbull” palmeirense? Simples: o Santos ousado, ofensivo e surpreendente, que simplesmente não era cotado para sequer disputar as primeira posições do Brasileiro, escancara o pouco que é feito no futebol do Palmeiras. O problema é que o torcedor palmeirense também fica com “ciúme” dos elogios feitos ao alvinegro praiano, e pensa “metemos quatro neles!”, em vez de se questionar sobre qual seria o nível de atuação do conjunto de Sampaoli se contasse com os jogadores alviverdes.
Além de Felipão e da patrocinadora Leila, Felipe Melo é outra cara visível deste atual Palmeiras. Considerando-se que na apresentação ele falou sobre “dar tapa na cara de uruguaio” e que virou até garoto-propaganda de comercial que brinca sobre sua agressividade, isso só corrobora a tal “antipatia” cultivada atualmente pelo clube.
A montagem do elenco é falha, com excesso de jogadores -o que cria instabilidade- e poucos de maior categoria. Enquanto o Flamengo atualmente dá aula do que fazer com o dinheiro, com contratações cada vez mais pontuais e de atletas mais diferenciados, Alexandre Mattos investe em baciada de “bons jogadores”. Só que a etiqueta de “melhor elenco do Brasil” superestima as opções e faz com que qualquer Thiago Santos, Hyoran e Deyverson seja visto como “ótima opção”. Tenho certeza que se estivessem em outros elencos não seriam vistos com a mesma generosidade.
Esse estado de espírito beligerante, com mania de perseguição, também é evidenciado nas comuns reclamações sobre o VAR ou na determinação de que os jogadores não falassem mais com a imprensa. E o que dizer, então, da recente frase de Felipão e dos cantos da Mancha Verde (que costuma ter um comportamento ainda mais deplorável que o das demais organizadas) falando até em morte?
Se o último título brasileiro deixou os palmeirenses de mãos atadas para esta temporada, a queda de Felipão é a oportunidade para abandonar o imediatismo e pensar adiante. A conquista deste Brasileirão embora ainda seja perfeitamente possível, já não está mais nas mãos alviverdes. E não é com um pensamento conservador e tacanho, apostando no “mais do mesmo” (e também antipático) Mano Menezes, que algo vai mudar. É momento de o palmeirense mostrar que exige mais. Senão de que serve ter mais poder financeiro que os demais?
Não existem atalhos. O Flamengo vem plantando há algumas temporadas e não conquistou o que o Palmeiras conseguiu neste período. Mas agora, maduro para a fase de colheita, teve a ousadia necessária para poder voar mais alto do que o palmeirense jamais sonhou nestes anos.
Caso contrário, terá que se conformar em seguir com o “espírito de porco” (sem trocadilhos) de torcer pelas derrotas dos festejados Flamengo e Santos, e deixar cada vez mais no passado os tempos em que era “A Eterna Academia” (em suas tantas versões, até Luxemburgo) quem provocava reverências de todos.