Créditos da imagem: AFP / Kamil Krzaczynski
Vivemos num mundo de fake news. Para todas as fontes de informações que olharmos, temos que ter o cuidado de analisa-la, avaliar se tem alguma consistência, se faz sentido, e buscar o contraponto. Não é difícil fazer isso, especialmente num mundo aberto e livre como o da internet.
Mas vivemos também o mundo da proliferação de notícias e matérias completamente sem sentido. Matérias que trazem obviedades e absurdos que parecem ter sido feitas numa mesa de bar. Se bem que quando o tema é futebol as mesas de bar costumam ser ambientes mais propícios a certas discussões.
Recentemente falei sobre os movimentos de consolidação e concentração no futebol mundial, e como isso já afeta o Brasil, de certa forma. Seja com o fortalecimento dos clubes europeus, passando pela fusão entre MLS (Liga Americana) e Liga Mexicana, e chegando finalmente a uma ideia de Libertadores Panamericana. Há inúmeros obstáculos a serem ultrapassados para uma competição como esta, cujo primeiro é simplesmente a distância. Imagine um jogo entre um clube Uruguaio e um Canadense. Isto provocaria uma demanda absurda por alterar calendários de todo o continente para abarcar uma competição que tem cara de caça-níqueis. A imitação da Champions League deveria começar pela estruturação e fortalecimento dos clubes, antes de pularmos todas as casas e irmos direto para a competição.
Eis que para defender a tese da Libertadores Panamericana me deparei com a matéria do UOL, chamada “10 motivos para torcer pela entrada de times dos EUA e Canadá (na Libertadores)”. Daí vou listar os temas e vamos analisa-los.
- Astros jogando no Brasil: a matéria lista a possibilidade de vermos atletas como Ibrahimovic, Rooney e Schweisteiger atuando no Brasil por seus times da MLS, e que isso seria muito bom. Sério mesmo? Atletas em final de carreira, jogando num nível abaixo do que já apresentaram seriam interessantes para o público? E se eles estiverem contundidos ou suspensos? Apenas como exercício, os 3 últimos campeões da MLS não tinham nenhum atleta conhecido mundialmente, e os na temporada atual os 4 melhores clubes também não tem. Logo, a tese vai para o ralo.
- Novo mercado para os clubes brasileiros, que poderiam acessar novos patrocinadores e vender mais camisas. Como assim? O que um clube brasileiro teria de interessante para aportar para empresas americanas que nem atuam no Brasil? E porque um clube brasileiro que fará poucos jogos na América do Norte, atuando numa competição sem rivalidade, atrairá atenção a ponto de vender camisas em abundância? Nem aqui no Brasil conseguimos isso, atuando o ano todo. Basta uma breve pesquisa para ver que os clubes europeus dominam o mercado de futebol nos EUA, fazendo pré-temporadas e atraindo a atenção. Como um Brasileiro que nem tem jogos transmitidos ocupará esse espaço? Por que a Exxon Mobil e a AT&T farão publicidade em clubes brasileiros?
- Mais transparência no apito: a tese é de que com americanos, mexicanos e canadenses os árbitros errarão menos, e será cobrada “mais profissionalização” da arbitragem. Bem, parte do princípio de que a América é a polícia do mundo e tudo que está sob suas ações será perfeito. Só esqueceram do fator humano, que árbitros interpretam, erram e não são deliberadamente equivocados. Aliás, é uma premissa perigosa. Absurda, até. E por fim, isso significa desvalorizar conquistas brasileiras. Ou apito só é bom quando nos beneficia?
- Qualidade do espetáculo: falam que os americanos trarão, além de lisura – logo, as Libertadores antes dele são todas fraudadas – qualidade na gestão do espetáculo. Querem uma final de Super Bowl na final da Libertadores. Novamente, onde isso é importante? Com gramados naturais na maior parte dos estádios é difícil promover espetáculos como a final do Super Bowl. E, francamente, como se isso mudar a realidade do esporte. Sem contar o custo, já que tanto se defende o “futebol para o povo”. Vai ter jornalista e torcedor reclamando de ter que pagar uma fábula para ver seu time jogar em Medellin. Mas terá show da Shakira!
- Valorizar o torneio: a entrada de mexicanos e da MLS traria valorização ao “campeão das américas”. Haja complexo de vira-lata aqui. A Libertadores é valorizada, e o problema está mais na decadência técnica dos clubes que na competição. No lugar de tentar valorizar um produto ruim deveriam melhorar o produto. Mas vamos para a perfumaria que é mais fácil, não?
- Jogos mais rentáveis: a premissa é de que os jogos teriam mais audiência com a entrada de mexicanos e MLS, e portanto os jogos seriam mais valorizados. Poderiam ao menos ter pesquisado a audiência da MLS. Nos últimos 3 anos as finais atingiram 0,4 – 0,8 – 0,5 pontos, o que representa menos de 1 milhão de telespectadores. Como esperam que uma competição nova, sem histórico e completamente fora dos padrões locais atraia público relevante do dia para a noite? Haja imaginação. Ou falta de informação.
- Jogos com lotação histórica: aqui foi demais. Citaram alguns amistosos envolvendo Real Madrid, Liverpool, Manchester United, que tiveram mais de 100 mil pessoas e já projetaram jogos envolvendo desconhecidos clubes brasileiros e bolivianos contra os americanos, imaginando que haveria lotações históricas! Citam a média do Seattle Sounders, acima de 50 mil pessoas – realmente um fenômeno! – mas ignoram que a média na MLS é da ordem de 23 mil. No Brasil as Libertadores atraem bom público, e a comparação com público de europeus chega a dar vergonha.
- Torcida fora do Brasil: com muitos brasileiros morando nos EUA seria um mercado a ser atendido e isto poderia resultar em americanos torcendo para clubes brasileiros. Novamente, com base em que? Sabemos onde vivem e quem são esses torcedores? Eles estarão dispostos a ir aos jogos? Os jogos serão em locais com muitos brasileiros? Premissa sem-pé-nem-cabeça, baseado no número de 500 mil brasileiros que vivem nos EUA.
- Intercâmbio de informações: com a qualidade de gestão dos americanos, poderiam nos ajudar a desenvolver a gestão dos clubes no Brasil. Mas por que precisa da Libertadores Panamericana para isso? É mais uma questão que já está na mesa e dependente mais da vontade dos nossos dirigentes que de uma competição. Não poderíamos estar fazendo isso há algum tempo?
- Maior vitrine para os atletas brasileiros: sim, parece fazer sentido. Mas já existem Brasileiros por lá. Além do mais, temos que trabalhar para segurar nossos melhores valores por aqui, e não pensarmos apenas em novos mercados.
Ou seja, 10 motivos completamente sem sentido e inúteis. Isso ocorre porque não se quer pensar na solução dos nossos problemas internos, em melhorar a qualidade das gestões dos clubes brasileiros, ajustar os calendários e competições, reduzir custos, reduzir a quantidade de clubes profissionais, trabalhar para mais receitas, enfim, transformar o que temos hoje numa indústria de verdade.
É claro que no longo prazo uma competição pan-americana poderia ser interessante, mas desde que o próprio futebol nos EUA e no México pudesse ser tão ou mais desenvolvido que o nosso. Os Mexicanos disputaram Libertadores até pouco tempo atrás, em muitos casos foram bem, mas em outros fizeram papelão. Claro que numa competição onde podem realmente serem campeões, e levem seus melhores clubes, haveria espaço para melhorias.
Para os clubes brasileiros ainda é tempo de trabalhar para resolver os problemas internos, fortalecer sua saúde financeira, fortalecer a marca do Campeonato Brasileiro no exterior, criar um produto efetivamente. E por fim, transformar o futebol numa indústria.
Precisamos de menos ilusões e mais planejamento. Ou continuaremos a ver boas ideias frustradas pelo amadorismo.
Have you ever thought about including a little bit more than just
your articles? I mean, wha you say iss valuable and all. Nevertheless just imagine if you added some great visuals or videos to give your
posts more, “pop”! Your content is excellent but with images and video clips,
this site could undeniably bee one of the very best in its niche.
Wonderfhl blog! https://Z42Mi.Mssg.me
… [Trackback]
[…] Find More to that Topic: noangulo.com.br/10-motivos-para-nao-termos-americanos-e-mexicanos-na-libertadores/ […]
… [Trackback]
[…] Read More Information here to that Topic: noangulo.com.br/10-motivos-para-nao-termos-americanos-e-mexicanos-na-libertadores/ […]