Créditos da imagem: Torcida Flamengo
Imaginem se a gigante Apple reunisse o mundo para anunciar que investirá bilhões no novo… WALKMAN – com fita cassete e tudo. E, pasmem, sem entender o fracasso da incrível iniciativa. Guardadas as devidíssimas proporções, é o que o Flamengo concretizou ao fazer de Vitinho a contratação mais cara de sua História. Dez milhões de euros num jogador que, tendo começado no meio-campo, acabou na ponta-esquerda por uma única razão: sua única jogada útil é cortar para o meio e chutar. E nem é aquela patada toda. Mas isso pouco importou. “Jogou bem na Rússia” – ou coisa parecida. É nisso que dá contratar por ouvir dizer. Dinheiro traz felicidade. Jogar dinheiro pela janela é que não traz.
Modelo de recuperação financeira, o Flamengo se torna a prova viva da complexidade de uma gestão esportiva, que exige gama de capacidades impossíveis de se reunir numa pessoa só. Ainda assim, o clube carioca extrapola. Consegue cometer praticamente todos os erros comuns nas contratações. Vitinho foi apenas a cereja podre do bolo estragado. Semana passada, antes da eliminação na Copa do Brasil, o jornal Extra fez avaliação dos 71 reforços da gestão Bandeira de Mello, desde 2013. A cotação predominantemente negativa foi até generosa. Por exemplo: quem venceu a Copa do Brasil em 2013 aumentou as estrelas, mesmo não jogando grande coisa. Curiosamente, mas não surpreendentemente, a mesma mídia do RJ saudou a imensa maioria dos contratados quando vieram. Incluindo Conca, na linha do “está velho e vem de lesão, mas se jogar metade do que jogava…”. Amadorismo e repórter chapa-branca são o Casal 20 das más escolhas.
A despeito dos critérios amadores, boa parte das contratações frustradas foi feita por dirigentes pagos. Em especial Rodrigo Caetano. Tal como Alexandre Mattos, ganhou fala de gerente moderno. Na prática, ambos torram o caixa dos clubes e ainda aparece jornalista amigo dizendo que são “hábeis negociadores”. Caetano só foi demitido em março de 2018. Entre as reinações consumadas, trouxe Marlos Moreno. Por dois meses, sensação do início de 2016, no Atlético Nacional. Caindo de produção já antes de ser negociado, fez seu último gol em junho daquele ano. Não se cogitou, em nenhum momento, que poderia ter sido uma grande fase de um jogador fraco – vide Lenny, nível The Best no início de 2006 e nulidade no resto da carreira. Como no caso de Conca, compraram pensando na melhor hipótese. Foi assim que Eike Batista ajudou a quebrar a economia.
Outra bomba foi Henrique Dourado, o ceifador. Dirigentes brasileiros têm esse probleminha de não aprender com a experiência. Com centroavantes, pensam que é só trazer alguém que “empurra pra dentro”. Não entendem, até hoje, que a incompatibilidade técnica prejudica a própria criação de jogadas. Na década passada, pensaram que Josiel (artilheiro do Brasileirão de 2007) seria o cara. “Se ele marcou 20 gols pelo Paraná, imaginem o que faria num time grande”. Tem muito torcedor que ainda cai nesse tipo de asneira. E, para quem pensava que a saída de Caetano mudaria visões, Uribe veio sob as mesmas expectativas. Numa tacada, também frustrou de vez a tese do “vasto mercado sulamericano”. A prática mostra grande dificuldade de adaptação, em especial dos supostamente mais técnicos. Mas quem se importa (não só no Flamengo) em rever conceitos?
Como principal reflexo das formações ruins de elenco (com ou sem caixa), o Flamengo perdeu relevância. Antes temido, hoje é um adversário ideal para ocasiões decisivas. Comentei com um amigo rubro-negro que, não fosse a década de 1980, o Flamengo não teria qualquer importância internacional. A resposta foi ainda mais amarga. Observa, não sem fundamentos, que há anos o Flamengo tem apenas grandeza regional. Só ganhou o Brasileirão de 2009, nas suas próprias palavras, “porque ninguém queria ganhar”. Foi, de fato, o campeão com menor pontuação nos pontos corridos. Houve as Copas do Brasil, mas vale lembrar que duas conquistas ocorreram sem os times que disputavam a Libertadores. Muito pouco para a maior torcida do Brasil. Menos ainda para um dos maiores cofres do país.
Difícil precisar o que seria, mas parece claro existir um mecanismo de auto-sabotagem na Gávea. Poderiam dizer que é o mal de ser um clube de massa, mas até aí o Corinthians vem obtendo resultados bem melhores – inclusive com situação financeira precária. O clube paulista parece controlar, na maior parte do tempo, as tentativas de influência de conselheiros e torcida. Também teve mais felicidade na definição dos treinadores nos últimos dez anos. Foram dez. O Flamengo teve dezenove, sem contar que Luxemburgo esteve duas vezes e também os interinos – sempre sob a crença da “mística” de Carlinhos e, depois, Andrade. O Corinthians tem um Norte como critério. Sempre que um Adílson ou um Osvaldo se enrolam, buscam um treinador de escola defensiva. O Flamengo está sempre mudando de ideia. Até por não ter mais ideia do que dá certo.
Não há dúvidas de que o Flamengo tem condições econômicas para entrar num rumo vencedor. Mas futebol não é concurso de riqueza. Voltando à conclusão do primeiro parágrafo, o uso infeliz dos ativos só pode gerar infelicidade. E, para quem achava que este rumo das glórias ainda poderia aparecer no horizonte de 2018, a vinda de Dorival Junior mostra que o pior adjetivo do incompetente é a convicção em seguir incompetente. Em bom dialeto carioca (via Januário de Oliveira), “sinistro”.
A impressão que dá é a de que o Flamengo NUNCA conseguirá colocar a casa em ordem.
Time de massa tem que ter MUITA competência para saber tocar, ou então vira bagunça e fracasso.