Créditos da imagem: Montagem/No Ângulo
Existem profissionais que dispensam apresentações. Particularmente no futebol, o currículo e as conquistas, muitas vezes, de tão expressivos que são, acabam evidenciando o “tamanho” do jogador.
Relembremos então um pouco da trajetória de um gigante da bola, um dos atletas que mais fizeram jus à palavra “profissional” (no bom sentido) em toda a história do futebol brasileiro: Zé Roberto.
– O então lateral-esquerdo surgiu como um meteoro na Portuguesa de Desportos em 1996, naquele inesquecível time vice-campeão brasileiro que perderia a final para o Grêmio;
– Da Lusa, foi direto para o Real Madrid (algo, hoje, inimaginável), por onde atuaria até 1998;
– Contratado pelo Flamengo, logo foi para o futebol alemão, onde definitivamente se consagraria como um jogador do “primeiro-escalão”;
– Atuando por Bayer Leverkusen e Bayern de Munique, o negro Zé Roberto virou referência na terra da Oktoberfest;
– Na Copa de 2006, atuando como volante, foi o único brasileiro eleito para a Seleção da FIFA dos melhores jogadores daquele Mundial (e olha que tínhamos os “Ronaldos” naquela edição);
– Depois da Copa, recuperou-se de contusão no Reffis do São Paulo e quase fechou com o Tricolor…;
– …Mas acabou assinando com o Santos. Atuando pelo Peixe, foi o melhor jogador do país (entre os que aqui atuavam) ostentando, como um meia clássico, a camisa 10 que um dia foi de Pelé;
– Entre 2009 e 2011, muito em razão do “cartaz” que até hoje tem por aquelas bandas, voltou a atuar no futebol alemão, dessa vez pelo Hamburgo;
– Depois, filho de Deus que é, já em fase final de carreira (?), foi atuar pelo Al-Gharafa, do Catar, em busca de aumentar o seu já vasto – e merecido – patrimônio acumulado;
– Os últimos clubes estão mais frescos na nossa memória – Grêmio e Palmeiras -, sendo que atualmente ainda é jogador do Alviverde, prestes a completar 42 anos de idade (!). Abaixo, com a camisa da equipe gaúcha;
Bom, depois dessa pincelada na brilhante carreira de Zé Roberto, através da qual, espero, tenha conseguido externar toda a admiração que nutro por ele, é chegado aquele crítico momento para qualquer colunista, o de opinar sobre a carreira de um jogador bastante querido pela crítica especializada e pelos “torcedores comuns”.
Pois bem. Zé Roberto é, no Palmeiras, apenas um rascunho do que já foi um dia. Com boa vontade, é, no máximo, um jogador “correto” na atualidade. E ser apenas “mais um” não combina com o seu passado. Ele merecia, por tudo que representou e ainda representa para o futebol, terminar a carreira “por cima”.
Ao tentar imaginar uma maneira suave e singela de transmitir o que penso, da maneira mais digna que o Zé Roberto merece, veio-me à mente o filme Madadayo, do mestre Akira Kurosawa. Em apertada síntese, Madadayo, que significa “ainda não”, é a reiterada resposta que o protagonista do filme (um idoso e aparentemente debilitado professor aposentado) dá para os convidados de suas festas de aniversário ano após ano, quando repetem a pergunta (num pequeno jogo ritualístico) se ele já estaria pronto para “partir”. Madadayo pode ser lido como um libelo pelo apego à vida mesmo nos seus momentos derradeiros, o que não pode ser tema mais apropriado, se os leitores me permitem a analogia, para um jogador sabidamente em fase final de carreira.
Como é típico da cultura oriental, o respeito pela vida construída e pela sabedoria e experiência dos mais velhos, dá o tom no longa. No caso de Zé Roberto, a admiração passa pela qualidade de seu futebol, mas, creio, principalmente em razão da sua longevidade e respeito pela profissão (além, é claro, da genética que obviamente lhe é favorável).
O que me deixa confortável para opinar pela sua aposentadoria é que o próprio Zé Roberto, possivelmente de maneira inconsciente, tenha se dado conta, após o título palmeirense da Copa do Brasil no final de 2015, que talvez ali fosse o momento de pendurar as chuteiras. Durante as comemorações, ele concedeu entrevistas deixando aberta a possibilidade de parar.
No entanto, compreensivelmente tentado pela ideia de disputar uma Copa Libertadores por um time que àquela altura prometia, o jogador decidiu protelar a sua aposentadoria, para, aí sim, com eventual conquista da América, encerrar a carreira com chave de ouro.
Quem sabe o Palmeiras não consiga lhe proporcionar isso. Embora o cenário seja dos mais desanimadores (Cuca só fez perder desde que chegou e o futebol praticado continua sofrível), o lado anímico, da motivação, pode – assim como foi na final da Copa do Brasil, quando o Verdão saiu vitorioso do duelo contra o favorito Santos – dar resultado.
Naturalmente que não é o ideal (a falta de planejamento em todos os departamentos do clube é evidente), mas, diante do tempo escasso para mudanças estruturais e da situação delicada na tabela de classificação, Cuca poderia utilizar o “fator Zé Roberto” para mobilizar o elenco de jogadores na decisiva partida contra o Rosario Central, na Argentina. Explico: imagino que se perguntado no vestiário se estaria pronto para se aposentar, Zé Roberto responderia com um sonoro “ainda não” aos seus companheiros. E o elenco, contagiado, poderia “fechar” em prol dessa causa.
Se seria o suficiente? Provavelmente não. Mas eu tentaria.
E segue o jogo.
Coluna espetacular, parabéns!
Valorizou o homem e o atleta, sem deixar de opinar que a hora do adeus está cada vez mais próxima (além de necessária).
Muito bom mesmo!
Que belo texto, Fernando Prado!
Concordo que o Zé Roberto não consegue mais atuar como titular em um time que tem pretensões de conquistas. Mas acho que, se ainda deseja continuar jogando, tem espaço em outros times menores. Quem sabe, se tiver algum carinho especial pela Portuguesa e objetivos maiores, não possa até voltar para a Lusa e ajudar na reconstrução do clube 😉
Obrigado, Gabriel. E eu também pensei nesse provável carinho dele pela Lusa. Quem sabe, poderia ser bem legal.
Compartilho da mesma opinião do Gabriel. A Lusa seria o lugar ideal até pra encerrar a sua vitoriosa carreira e também uma forma de agradecimento. Bela crônica do Fernando.
Ademir Tadeu , obrigado! #zerobertonalusa Hehehe
Ex- jogador em atividade. Última vez que jogou bola foi no Peixe em 2007. Quase DEZ anos atrás. E já era velho…
Por essas e outras que leio frequentemente as colunas do Fernando Prado, pois suas colunas são simplesmente inteligentes. Quanto a motivação para conquista do cada vez mais distante título da libertadores, realmente seria contagiante o “Madadayo”, como já dito, muito bem trazido pelo colunista. abcs
Parar ou não parar, José Aquino? Eis a questão. Gilberto Maluf, Ademir Tadeu, Adilson Dutra, Claudemir Oliveira Andrade, João Ricardo Lebert Cozac, Waldir Albieri etc o que vocês acham?
Parar antes que sejam parados.
João Ricardo Lebert Cozac , adorei! 😀
O Zé é um sobrevivente dos tempos em que tínhamos um futebol alegre e bem jogado. Só isso já lhe confere o respeito de todos nós, torcedores ou não do Palmeiras.
Muito bom Fernando Prado. Penso que o Zé Roberto não tem mais o preparo físico necessário para fazer frente ao jogo intenso que se pratica. Pode até jogar em algum time pequeno, em campeonatos intermediários, o que seria até uma atração.
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